Um acidente que reforça a importância do seguro para obras públicas.
Como amplamente noticiado, no feriado de 21 de abril passado, um trecho da ciclovia Tim Maia que margeia avenida costeira no bairro carioca de São Conrado desabou devido ao impacto de uma onda, lançando ao mar e matando duas pessoas e causando espanto a milhões de outras.
Até o momento, a prefeitura do Rio de Janeiro e a construtora envolvida não revelaram se tem ou não seguros que cubram os dois riscos que se materializaram no aludido sinistro: o desabamento (dano material sofrido pela estrutura) e as mortes (danos corporais e morais sofridos por terceiros). Os seguros que se aplicariam ao caso seriam os de riscos de engenharia, garantia de obrigações e os de responsabilidade civil geral, responsabilidade civil profissional e responsabilidade civil para diretores e administradores (D&O).
No entender do professor Sergio Ricardo Souza, coordenador acadêmico da Escola Nacional de Seguros, caso a Prefeitura haja contratado o seguro de riscos de engenharia, além das coberturas básicas durante a fase de construção, deveriam estar previstas coberturas adicionais para erros de projetos, responsabilidade civil geral, danos morais, lucros cessantes e salvamento e contenção de sinistros. Após a construção, a ciclovia Tim Maia poderia ser protegida pela extensão de cobertura para obras civis, instalações e montagens concluídas.
O também professor da Escola Nacional de seguros, Gustavo Mello, considera que seria desejável ainda a contratação de uma cobertura de manutenção ampla, válida por um período de seis meses a dois anos, conforme as características de cada obra. Para Gustavo, no entanto, esse é um episódio para se considerar não apenas a contratação de seguro que garanta a construção civil, mas também contratação de estudo de impacto dos riscos da natureza na região, tendo como referência, por exemplo, os preceitos do PMI (Project Management Institute), uma associação internacional de profissionais ligados à gestão de projetos.
O seguro cobriria?
Foi noticiado que o projeto de construção da ciclovia não avaliou o impacto das ondas na pista da construção que fica justamente sobre o mar, apenas analisaram os pilares de sustentação. A ser isto verdade, na existência de eventual contrato de seguro, o desabamento provavelmente não daria direito à indenização.
De fato, os contratos de seguro podem indenizar os danos causados por culpa leve do segurado, mas excluem culpa grave (a negligência ou imprudência flagrantes) que se aproxima do dolo. Porém, na prática, não é fácil distinguir os casos de culpa grave para efeito de exclusão de cobertura de seguro, dada a dificuldade de se provar o elemento subjetivo, ou seja, a intenção que bordeia a má-fé. Esta, inclusive, só pode ser estabelecida por sentença de corte civil.
No caso da indústria de construção civil, os tribunais têm decidido que o contratante também responde pelos eventuais danos que o construtor tenha causado a terceiros. Quando o dano decorre de ação ou omissão de entidade ou pessoa vinculada, a culpa pode ser caracterizada como “in vigilando” ou “in elegendo”. A culpa “in vigilando” decorre da falta de atenção do responsável pelo comportamento da agente que está sob a sua responsabilidade. A culpa “in elegendo” decorre da má escolha daquele a quem se confia a prática de um ato ou o cumprimento de uma obrigação.
O entendimento é que o acidente torna manifesto que o “dono da obra” escolheu inadequadamente a empresa encarregada da sua execução ou faltou com a devida atenção ao andamento da obra. Se acionado e possuidor de seguro de RC, o contratante tem direito à indenização, mas a seguradora irá acionar a construtora para tentar recuperar a indenização paga.
Seguro de obras públicas
Em entrevista a TV, o professor Paulo Rosmam, do Instituto de Engenharia Alberto Luiz Coimbra (COPPE/UFRJ), defendeu que se adote no Brasil a prática de contratação de seguros para grandes obras públicas, como é feito em diversos países. A justificativa é que a segurança das obras seria grandemente aumentada, pois, para aceitação do risco, as seguradoras exigem maior cuidado técnico e rigor na análise do projeto e na sua execução. Além disso, visto que o prêmio de seguro depende também do preço da obra, a entrada das seguradoras nesse setor poderia ter efeito estimulador do controle de custos por parte de empreiteiras e dos entes governamentais contratantes.
De fato, a Lei de Licitações (Lei n° 8.666, de 21/06/93) pouco enfatiza a contratação de seguros. Apenas menciona que o Edital pode prever a exigência de seguros, “quando for o caso” e que a contratada pode optar por obter seguro garantia como uma das possíveis “modalidades de garantia” (outras podendo ser caução em dinheiro ou títulos e fiança bancária). Já a Lei de concessão e permissão da prestação de serviços públicos (Lei n° 8.987, de 13/02/95) é absolutamente omissa no que se refere a seguros. E ambas colocam o contratado como responsável pelos danos causados a terceiros, decorrentes de sua culpa ou dolo, não excluindo ou reduzindo essa responsabilidade a fiscalização ou o acompanhamento pelo órgão governamental interessado.
A proposta de Rosman é louvável, porém, para sua implantação, é necessário superar obstáculos culturais e técnicos. Em nosso país, muitas vezes, as obras públicas são executadas em meio a suspeitas de corrupção. Obviamente, num contexto de opacidade, os que se beneficiam dessas distorções resistirão à inspeção das seguradoras. Do ponto de vista técnico, tais obras exigem seguros com clausulados complexos, eventualmente passíveis de interpretações divergentes quando ocorre um sinistro e, por isso mesmo, objetos de contestação judicial quanto ao direito de receber a indenização. E todos sabem que os contenciosos judiciais no Brasil podem se arrastar por anos.
Entretanto, no caso da ciclovia carioca, tudo isso são conjecturas. O fato é que no Brasil faltam prevenção, respeito às normas de segurança e fiscalização das obras públicas e privadas e sobram os desperdícios. E ambos poderiam ser minimizados pelo maior recurso de contratantes e contratados ao instituto do seguro.
Fonte: Tudo Sobre Seguros.
Até o momento, a prefeitura do Rio de Janeiro e a construtora envolvida não revelaram se tem ou não seguros que cubram os dois riscos que se materializaram no aludido sinistro: o desabamento (dano material sofrido pela estrutura) e as mortes (danos corporais e morais sofridos por terceiros). Os seguros que se aplicariam ao caso seriam os de riscos de engenharia, garantia de obrigações e os de responsabilidade civil geral, responsabilidade civil profissional e responsabilidade civil para diretores e administradores (D&O).
No entender do professor Sergio Ricardo Souza, coordenador acadêmico da Escola Nacional de Seguros, caso a Prefeitura haja contratado o seguro de riscos de engenharia, além das coberturas básicas durante a fase de construção, deveriam estar previstas coberturas adicionais para erros de projetos, responsabilidade civil geral, danos morais, lucros cessantes e salvamento e contenção de sinistros. Após a construção, a ciclovia Tim Maia poderia ser protegida pela extensão de cobertura para obras civis, instalações e montagens concluídas.
O também professor da Escola Nacional de seguros, Gustavo Mello, considera que seria desejável ainda a contratação de uma cobertura de manutenção ampla, válida por um período de seis meses a dois anos, conforme as características de cada obra. Para Gustavo, no entanto, esse é um episódio para se considerar não apenas a contratação de seguro que garanta a construção civil, mas também contratação de estudo de impacto dos riscos da natureza na região, tendo como referência, por exemplo, os preceitos do PMI (Project Management Institute), uma associação internacional de profissionais ligados à gestão de projetos.
O seguro cobriria?
Foi noticiado que o projeto de construção da ciclovia não avaliou o impacto das ondas na pista da construção que fica justamente sobre o mar, apenas analisaram os pilares de sustentação. A ser isto verdade, na existência de eventual contrato de seguro, o desabamento provavelmente não daria direito à indenização.
De fato, os contratos de seguro podem indenizar os danos causados por culpa leve do segurado, mas excluem culpa grave (a negligência ou imprudência flagrantes) que se aproxima do dolo. Porém, na prática, não é fácil distinguir os casos de culpa grave para efeito de exclusão de cobertura de seguro, dada a dificuldade de se provar o elemento subjetivo, ou seja, a intenção que bordeia a má-fé. Esta, inclusive, só pode ser estabelecida por sentença de corte civil.
No caso da indústria de construção civil, os tribunais têm decidido que o contratante também responde pelos eventuais danos que o construtor tenha causado a terceiros. Quando o dano decorre de ação ou omissão de entidade ou pessoa vinculada, a culpa pode ser caracterizada como “in vigilando” ou “in elegendo”. A culpa “in vigilando” decorre da falta de atenção do responsável pelo comportamento da agente que está sob a sua responsabilidade. A culpa “in elegendo” decorre da má escolha daquele a quem se confia a prática de um ato ou o cumprimento de uma obrigação.
O entendimento é que o acidente torna manifesto que o “dono da obra” escolheu inadequadamente a empresa encarregada da sua execução ou faltou com a devida atenção ao andamento da obra. Se acionado e possuidor de seguro de RC, o contratante tem direito à indenização, mas a seguradora irá acionar a construtora para tentar recuperar a indenização paga.
Seguro de obras públicas
Em entrevista a TV, o professor Paulo Rosmam, do Instituto de Engenharia Alberto Luiz Coimbra (COPPE/UFRJ), defendeu que se adote no Brasil a prática de contratação de seguros para grandes obras públicas, como é feito em diversos países. A justificativa é que a segurança das obras seria grandemente aumentada, pois, para aceitação do risco, as seguradoras exigem maior cuidado técnico e rigor na análise do projeto e na sua execução. Além disso, visto que o prêmio de seguro depende também do preço da obra, a entrada das seguradoras nesse setor poderia ter efeito estimulador do controle de custos por parte de empreiteiras e dos entes governamentais contratantes.
De fato, a Lei de Licitações (Lei n° 8.666, de 21/06/93) pouco enfatiza a contratação de seguros. Apenas menciona que o Edital pode prever a exigência de seguros, “quando for o caso” e que a contratada pode optar por obter seguro garantia como uma das possíveis “modalidades de garantia” (outras podendo ser caução em dinheiro ou títulos e fiança bancária). Já a Lei de concessão e permissão da prestação de serviços públicos (Lei n° 8.987, de 13/02/95) é absolutamente omissa no que se refere a seguros. E ambas colocam o contratado como responsável pelos danos causados a terceiros, decorrentes de sua culpa ou dolo, não excluindo ou reduzindo essa responsabilidade a fiscalização ou o acompanhamento pelo órgão governamental interessado.
A proposta de Rosman é louvável, porém, para sua implantação, é necessário superar obstáculos culturais e técnicos. Em nosso país, muitas vezes, as obras públicas são executadas em meio a suspeitas de corrupção. Obviamente, num contexto de opacidade, os que se beneficiam dessas distorções resistirão à inspeção das seguradoras. Do ponto de vista técnico, tais obras exigem seguros com clausulados complexos, eventualmente passíveis de interpretações divergentes quando ocorre um sinistro e, por isso mesmo, objetos de contestação judicial quanto ao direito de receber a indenização. E todos sabem que os contenciosos judiciais no Brasil podem se arrastar por anos.
Entretanto, no caso da ciclovia carioca, tudo isso são conjecturas. O fato é que no Brasil faltam prevenção, respeito às normas de segurança e fiscalização das obras públicas e privadas e sobram os desperdícios. E ambos poderiam ser minimizados pelo maior recurso de contratantes e contratados ao instituto do seguro.
Fonte: Tudo Sobre Seguros.
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